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14 de dezembro de 2015

Post Nº 50 - A Minha Guerra (Firmino)

José Rodrigues Firmino
Sol. Atir. em Jolmete (Pelundo – Teixeira Pinto)
CCAÇ 2585 – BCAÇ 2884















Caros Camaradas e amigos:

Vou publicar um texto que escrevi para uma pessoa que está a fazer um livro sobre o assunto, e publico neste blog, para que todos os meus amigos e camaradas o possam ler.



José Rodrigues Firmino
Nasci a 29 de Junho de 1947
Fui incorporado no RI 14 (Regimento de Infantaria de Viseu),
Especialidade no RI 1 (Regimento de Infantaria Um da Amadora) e
IAO no Pragal (Almada). IAO quer dizer Instrução de Aperfeiçoamento Operacional, e era feito imediatamente antes do embarque para a guerra.
Fiquei a pertencer à Companhia de Caçadores “2585 – É AQUELA MÁQUINA” e ao Batalhão de Caçadores “2884 – MAIS ALTO”













O texto a seguir apresentado foi escrito por mim em 2013 e publicado no blog “Memórias de Jolmete”. Aqui resumo a minha passagem por Jolmete, no Norte da Guiné.
Ver “MEMÓRIAS DE JOLMETE” – Post Nº 8-Uma história de vida


***
Uma história de vida:
Sou José Rodrigues Firmino, presentemente com 65 anos de idade, e aproveito para trazer aqui um pouco da minha passagem pela Guiné Bissau, antiga colónia Portuguesa, enquanto militar. Decorria a década de sessenta, mais concretamente o dia 7 do mês de maio de 1969, quando no cais marítimo de Alcântara em Lisboa, eu e tantos outros jovens rumamos para a Guiné Bissau, com o objetivo de cumprir o serviço militar obrigatório, numa das ex-províncias Ultramarinas, que com muita mágoa minha, alguns teimam em esquecer ou ignorar.

Na hora marcada, lá estava atracado o cargueiro Niassa, pronto para levar, jovens tirados precocemente aos seus pais, namoradas e até mulheres, rumo aquele País para nós desconhecido, para uma guerra que nunca desejamos e desconhecíamos. A viagem foi muito dolorosa e atribulada, para começar a alimentação era péssima, as camas ali chamadas de “tarimbulas” eram feitas em madeira, algumas casas de banho eram barracos cobertos com chapas de zinco.


Cargueiro  Niassa


Chegados à Guiné Bissau lá estavam à nossa espera viaturas militares para nos conduzirem até à lancha que nos levaria, Mansoa acima, até Teixeira Pinto. Dormimos três noites numa escola, em que os nossos colchões eram simplesmente o chão da própria escola. Após três noites de estadia em Teixeira Pinto outra etapa nos aguardava, irmos para o nosso destino, Jolmete, que ficava a 20Km de distância. Organizada a coluna, viaturas militares nos levaram para a zona de Jolmete, uma das zonas mais isoladas da Guiné.

Por fim chegados a Jolmete (onde estive toda a comissão de serviço), fomos  distribuídos por diversos pelotões, começando ai o nosso tormento.
Todos os dias pensava se conseguiria chegar ao dia seguinte, felizmente cheguei  outros não tiveram a mesma sorte infelizmente.



Aquartelamento em Jolmete



Mesmo com a nossa juventude, sabendo que tínhamos de lutar, para não morrer, sinto orgulho de ter podido continuar com nosso trabalho, ajudar na melhoria das condições de vida daquelas populações. Construímos 22 tabancas (habitações), não direi excelentes, mas muito melhores do que as existentes, uma escola, uma cozinha comunitária, um abrigo para um grupo de combate, uma padaria, etc.







Lutando e construindo.


Inauguração da Escola


Para além do trauma de guerra, revolta-me o esquecimento por vezes até o abandono a que todos os ex-combatentes estão sujeitos por parte de grande parte da sociedade e muitos governantes em geral.
Desconhecem que muitos perderam a vida, outros regressaram com deficiências, muitos nunca conseguiram ultrapassar o trauma da guerra. Há relatos que alguns ex. Combatentes, para além de estarem na miséria, passam fome.

Adoro o meu País defendi a nossa bandeira, ignorados jamais esquecidos. Tenho pelo povo Guineense a maior consideração e estima estais para sempre no meu coração. Ainda hoje pelo que acabei de transcrever modestamente vamos ajudando o povo Guineense e suas populações com o envio de sementes e outros bens, abertura de poços com água potável, livros, material didáctico, etc.
Assim termina o testemunho de alguém que, mesmo contrariado, sente orgulho em ter servido o seu pais, defendendo a sua bandeira.
José Rodrigues Firmino (Março de 2013)
***


Disse atrás que muitos camaradas perderam a vida na guerra, e da minha Companhia tivemos quatro mortos:
o Soldado António Barbosa e o Milícia João Silva, vítimas de acidente com arma de fogo no dia 27 de Maio de 1969; 
o Soldado Indibe Sambú e o Milícia Dante Cadí em 22 de Junho de 1969, um mês depois, estes em combate, vítimas de uma emboscada.


Eu na Capela lembrando os nossos mortos


A minha Companhia teve uma actividade operacional muito grande, com saídas diárias para o mato, a par dos trabalhos de construção civil e alfabetização da população.

Ver “MEMÓRIAS DE JOLMETE” – Post Nº 6-Actividade Operacional da CCAÇ 2585-É aquela Máquina


Tivemos também dois louvores do Comando-Chefe da Guiné, Sr. General Spínola pela actividade desenvolvida no âmbito da nossa Companhia e que transcrevo, mas também podem ser vistos no blog atrás citado:

Ver “MEMÓRIAS DE JOLMETE” – Post Nº 13-Louvores e Condecorações







Durante a minha comissão ocorreu um acto terrorista, mais concretamente a 20 de Abril de 1970, e que foi o que mais me marcou em toda a comissão, quer pela brutalidade dos assassinatos, quer pela proximidade do meu quartel.
A morte (assassinato) de sete pessoas, desarmadas, em prol da paz na Guiné.

São eles:
Major Passos Ramos
Major Magalhães Osório
Major Pereira da Silva
Alferes Joaquim Mosca (da minha Companhia)
Dois condutores dos Jipes
Um Tradutor

Ver mais pormenores em:
“MEMÓRIAS DE JOLMETE” – Post Nº 2-A minha Guerra



Terminada a comissão na província da Guiné em Fevereiro de 1971, regressei à Metrópole no cargueiro Uíge, tendo desembarcado no dia 2 de Março de 1971.


Cargueiro Uige



José Rodrigues Firmino
Dezembro de 2015



Publicado por
Manuel Resende (Ferreira)