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31 de março de 2020

Post Nº 81 - F.N.A.C. ou Quarentena?

Manuel Cármine Resende Ferreira
Alf. Mil. Art. em Jolmete (Pelundo – Teixeira Pinto)
CCAÇ 2585 – BCAÇ 2884











F.N.A.C. ou Quarentena?

Este tema já foi aqui publicado em 08-12-2012, no meu Post Nº 3, mas dada a situação em que nos encontramos achei por bem republicar com algumas alterações ao texto inicial, aplicando-o à nossa situação actual de quarentena.

QUARENTENA? O QUE É ISSO? COMPARADA COM A NOSSA GUERRA?

O tempo da nossa passagem pela guerra, mais concretamente pela Guiné, não foi feito só de tristezas, desalentos, isolamento, saudades, … enfim, tantos outros sentimentos que não vale a pena enumerar. Também passámos os nossos bons momentos de boa disposição, camaradagem, convívio, etc. A nossa vida (a da minha Companhia) era passada dentro de duas fiadas de arame farpado, com cerca de dois metros de altura. Só havia uma porta para entrar e sair. Sair para onde? Para a mata em operações, ou particularmente para matar uns pombos ou perdizes com a minha pressão de ar "DIANA 35 de 5,5", mas sem muito afastamento. Qualquer um fora do arame farpado podia ser apanhado à mão.
Isto, de facto era uma clausura, estávamos no mato, não numa vila ou cidade. O pessoal começava a ficar "apanhado" ou como agora se diz "stressado" e eis que na Companhia 2585 de Jolmete de Maio de 1969 a Março de 1971 houve, em determinada altura, meados de 1970, depois do assassinato dos Oficiais do CAOP, um grupo de graduados, que de tão apanhados que estavam, criaram a F.N.A.C.

Não estejam já a imaginar uma empresa de ar condicionado para a Guiné, (ali na Avenida  de Ceuta) nem tão pouco uma editora de livros ou discos de vinil ou CDs. Não, tratava-se pura e simplesmente de uma fundação, a “FUNDAÇÃO NACIONAL DOS APANHADOS DO CLIMA”, em abreviaturas F.N.A.C.

A F.N.A.C. era composta por todos os oficiais e sargentos da Companhia 2585 que quisessem aderir. Praticamente aderiram todos. Disse praticamente, pois de facto houve um oficial e um ou dois furrieis que não aderiram. Os aderentes, como fazia parte dos estatutos, tinham de ter um nome artístico. A nossa imaginação dava para tudo. Depois de fazerem o juramento de adesão conforme anexo I e II, ficavam a pertencer ao grupo dos “desorganizados”, pelo que recebiam o respectivo cartão de “sócio”. Junto fotos de alguns desorganizados, cujos cartões aqui apresento (só consegui estes) e graças à gentileza do nosso Furriel Rodrigues, digníssimo presidente.


 Fotos Nº 1 – 1º Sarg. Vinagre

Foto Nº 2 – Fur Araújo



Foto Nº 3 – Alf. Godinho




Foto Nº 4 – Fur. Gomes


 Foto Nº 5 – Fur. Gondar

 Foto Nº 6 – Alf. Ferreira

Foto Nº 7 – Fur. Filipe

 
Foto Nº 8 – 2º Sarg. Mesquita


Foto Nº 9 – Fur. Rodrigues

Como Organização que era composta por "desorganizados", tinha os seus membros de Direcção e que eram exercidos por:
Presidente: Furriel José Manuel Gonçalves Rodrigues, de nome artístico “GEM-GIS-KAN” 
Secretário: Alferes António Alberto Miguéis Marques Pereira, de nome artístico ”WASINGTON”.
Tesoureiro: Furriel Manuel Joaquim Meireles, de nome artístico “O MENINO DO BARREIRO”.

A F.N.A.C. agora já posso tratá-la assim, tinha como objectivo desanuviar a cabeça de todo o pessoal com alguns passatempos, como jogos de futebol, sessões de ilusuinismo feitas pelo nosso amigo Furriel Pargana que engolia agulhas verdadeiras e saiam todas enfiadas numa linha... ainda não percebi o truque, sessões de discos pedidos na "RÁDIO PIRATA DE JOLMETE. Além dos estatutos pensados e escritos ponto a ponto, com a colaboração dos associados, e votados sempre em assembleia-geral, criámos também o Cartão individual com foto artística do associado, e o emblema de lapela que foi desenhado pelo Furriel Cristo. Aproveitando a vinda de férias à Metrópole do nosso presidente, foi encarregue de os mandar fazer na Fotal em tempo útil. Assim aconteceu.


Foto Nº 10 – Emblema de lapela

À distância de 50 anos tenho pena que o ponto Nº 1 dos estatutos restringisse a adesão apenas a graduados da CCAÇ 2585, pois tivemos muitas solicitações para aderências por  parte de outros graduados que gostariam de pertencer, o que viria a valorizar no futuro (agora) os nossos convívios. Refiro-me concretamente à Companhia de Comandos que esteve em Jolmete em Outubro de 1970, creio que foi a 36ª, mas não tenho a certeza. Enfim, temos de interpretar os estatutos à luz dos tempos de então, pessoal apanhado à espera da peluda e cheio de boas intenções.

Agora perguntam os amigos leitores deste apontamento… “então e onde está a F.N.A.C.”? Boa pergunta, mas sinceramente sei responder. Tenho contactos com o presidente, o José Rodrigues que vive no Fundão e com o tesoureiro o Meireles que vive em Linda-a-Velha. Espero que o Marques Pereira também apareça, mas parece-me que anda para os lados de Moçambique. E não é que o Marques Pereira apareceu ...? 
Vive em Moçambique mas consegui encontrá-lo. Numa das suas vindas a Portugal consegui organizar um almoço no Restaurante Caravela de Ouro em Algés. Neste convívio estiveram presentes os três elementos da administração, além de outros 8 camaradas que quiseram e puderam estar presentes, uns vindos do Norte (Montalegre) e outros do Sul (Vila Real de S. António). Quando há amizade, não há distâncias. Assim se concratizou o 1º Convívio da F.N.A.C. A seguir publico o link para verem as fotos desse convívio. Aproveito e peço a quem tiver alguma cassete de outos programas nossos, e que foram muitos, se podem facultar a fim de eu os digitalizar e publicar aqui. As cassetes serão devolvidas, como é lógico.


Link para ver as fotos do almoço-convívio


Paralelamente ao que acontecia na parte militar, a F.N.A.C. também concedeu alguns louvores aos desorganizados que mais apanhados estivessem. A mim tocou-me também esse galardão, que passo a reproduzir. 




Fotos Nº 11 e 12 - Louvor 


A F.N.A.C. tinha também como missão animar todo o pessoal da 2585, pois não eram só os graduados que andavam apanhados. Para isso fundámos a “RADIO PIRATA DE JOLMETE”. Esta Rádio, cujo aparelho transmissor era um receptor a válvulas do curso da “RÁDIO ESCOLA” que eu tinha tirado no último ano antes da minha entrada na tropa, e que tinha levado para a Guiné, serviu para, com uma adaptação feita por mim, transformá-lo em “emissor-receptor”. 

Com uma boa antena cedida pelo nosso Furriel Gomes de transmissões, e instalada entre a caserna do 4º grupo e o refeitório dos soldados, conseguia captar perfeitamente a EN em onda média e curta, e dar um pouco de música durante o jantar.

Convém dizer que o som era dado por uma coluna feita pelo nosso carpinteiro, tipo corneta com um altifalante que eu levei e que me tinha custado na “Astro-Técnica” 2.200$00, com 40 W de potência. Pesava cerca de 5 KG. Mais à noite retransmitia a EN e outras em onda curta, numa frequência que todos os pequenos receptores a pilhas com OM-OC captavam. 

Nesta frequência era transmitido também um programa de discos pedidos que às vezes fazíamos, no abrigo do comando, numa pequena sala do 1º Sargento Vinagre. Na foto que a seguir mostro, vê-se o grupo de locutores em acção. À esquerda o Furriel Guarda, ao centro o Furriel Rodrigues (nosso presidente) e à direita o Alferes Marques Pereira (nosso secretário).

Foto Nº 13 – Locutores em acção


Isto sim, era quarentena. Só lá entravam virus se viessem pelo ar de alguma morteirada 82 ou canhão se recuo, o que felizmente não aconteceu durante a nossa passagem por Jolmete. Há, já me esquecia, tivémos de facto um virus grande, que andava a dar cabo dos nossos porcos, e que vinha à noite, sorrateiramente levar mais um... Este virus também foi eliminado por nós. Que bela onça foi sacrificada para provar a uns jornalistas do Washington Post, que estavam lá a fazer uma reportagem, que as onças não eram enviadas pelo Amilcar Cabral... Quem quiser pormenores, pergunte.








Fotos Nº 14 a 20 – Estatutos da FNAC

AGORA DIGAM LÁ SE ISTO NÃO ERA QUARENTENA... 22 MESES


Manuel Resende (Ferreira)



2 de novembro de 2016

Post Nº 68 - Os nossos Mortos


Manuel Cármine Resende Ferreira
Alf. Mil. Art. em Jolmete (Pelundo – Teixeira Pinto)
CCAÇ 2585 – BCAÇ 2884

















Camaradas e amigos,
Não posso deixar passar este dia 02-11-2016, sem lembrar os nossos mortos, os da nossa companhia, a CCAÇ 2585 de Jolmete, "AQUELA MÁQUINA". Assim lembro:

Mortos em 27-05-1969 em Jolmete:
António Barbosa, Soldado
João Silva, Milícia
Estes dois combatentes morreram vítimas de acidente com arma de fogo, ao chegar ao quartel, depois da operação de segurança ao regresso da Companhia CCAÇ 2366. A granada da basuca, ao ser retirada caiu pelo tubo e explodiu. Além dos mortos citados, houve muitos camaradas que apanharam estilhaços, inclusive, o Sr. Alf. Mil. Almendra, mais tarde Comandante de Companhia. Ainda hoje tem o estilhaço no ombro.

***

Mortos em 22-07-1969 em Jolmete:
Indibe Sambú, Soldado
Dante Cadi, Milícia
Um soldado nativo e um milícia, mortos numa emboscada. Tiveram azar pois foram apanhados por uma roquetada de RPG2 ou 7. Embocada em U em que nós entrámos onde não devíamos ter entrado. Estavam à nossa espera, não houve hipótese de fuga.

***

Mortos em 20-04-1970 em Jolmete:
Joaquim João Palmeiro Mosca, Alf. da CCAÇ 2585, comandante do Pelotão de Nativos 59, e destacado para o CAOP em Teixeira Pinto. Assassinado pelo PAIGC em Jolmete, juntamente com os Srs. Majores:
Passos Ramos
Magalhães Osório
Pereira da Silva
e três elementos nativos:
Mamadú Lamine
Aliú Sissé
Patrão da Costa

***

Lembro também:
Fernando José Ferreira Vinagre, 1º Sargento
Albertino de Sousa Ribeiro, 2º Sargento
João Fernando Pereira, 1º Cabo


Espero que todos tenham um repouso condigno, e que, onde estejam, zelem pelos seus camaradas de armas, que bem precisam.