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20 de outubro de 2015

Post Nº 40 - Aventura com final feliz... (13)

Augusto Silva Santos
Fur. Mil. da CCAÇ. 3306 em Jolmete (Pelundo - Teixeira Pinto)














13 - Aventura com final feliz…

Todos tínhamos grande admiração pelo Comandante da Milícia. Era um grande guerrilheiro, grande conhecedor da região no Chão Manjaco, fiel aos seus princípios, amigo do seu amigo, daí que ainda hoje seja recordado com respeito pela generalidade daqueles que com ele lidaram mais de perto. Infelizmente o Dandi, como muitas outros que estiveram do nosso lado, acabaria por ter um fim trágico, após a nossa retirada da Guiné. Pura e simplesmente foi eliminado em circunstâncias mais ou menos obscuras, como é “usual” nestes casos.

Fora o aspecto militar, era uma pessoa como tantas outras e, enquadrada naquilo que era considerado natural socioculturalmente dentro das diversas etnias na Guiné, ou seja, com um peso religioso muito determinante no que respeita ao relacionamento e tratamento dos seus filhos e suas mulheres.

Sendo quem era, para além do que já referi no contesto militar, também no aspecto civil, se assim se pode considerar ou desassociar, era igualmente muito respeitado (ou temido?), tendo um estatuto acima da média dos restantes elementos da população masculina da tabanca, daí que no meu tempo de Jolmete, era casado (ou possuía) 4 mulheres. Era uma situação perfeitamente aceite por todos tendo em conta a sua crença religiosa, que nem sequer chocava aqueles que, da nossa parte, se assumiam mais ortodoxos quanto a esses hábitos, religiosamente falando.

Até aqui tudo bem, só que o nosso amigo Dandi nem sempre se mostravam muito “civilizado” (no nosso conceito) relativamente ao relacionamento que tinha para com as suas mulheres, sendo por vezes uma pessoa muito agressiva e até prepotente. Era do nosso conhecimento que com alguma frequência lhes batia, principalmente nas mais velhas, algo que de facto nos incomodava mas, dadas as circunstâncias, não tínhamos grandes hipóteses de interferir.

Estando este facto em determinada altura a tomar proporções alarmantes, diria mesmo, preocupantes, uma das suas mulheres tomou a decisão de fugir, daí ter tentado por diversas vezes obter sem êxito o “passaporte” (guia de transporte) para dali sair e assim escapar aos maus tratos a que estava a ser sujeita.

Ora isto era algo quase impensável, e ninguém se atrevia a deixar sair umas das mulheres do Dandi, sem ele ter conhecimento de tal facto. Ela só poderia ausentar-se de Jolmete se houvesse uma prévia autorização do Comandante da Milícia. Pôr-se a caminho sozinha, estava fora de questão, pois seria facilmente apanhada, pelo que a única solução era mesmo aproveitar uma das ausências do marido para sair através de um transporte, primeiro até ao Pelundo, e depois com ajuda de familiares iria tentar seguir para norte. Para que isto resultasse era preciso o envolvimento (conivência) de várias pessoas, dada a “complexidade” da situação.

Tomada a decisão por parte do meu amigo Borges, 1º Cabo impedido do Comandante de Companhia, em ajudar a infeliz mulher, restava organizar o esquema para que os resultados fossem os desejados. Assim, em determinado dia de ausência mais ao menos prolongada do Dandi e coincidente com uma coluna para o Pelundo, combinou-se a fuga da Nhimba Djassi. Para não sair directamente do quartel, ela apanhou a viatura na bolanha onde íamos à água, cujo abrandamento era quase obrigatório, e onde se montava sempre uma pequena segurança para entrada de outro pessoal. A mesma era conduzida pelo nosso amigo “Bob”, que já estava identificado com o esquema. Sendo eu o chefe de viatura, limitei-me a conferir se estava tudo correcto com a guia de transporte, e lá seguimos viagem.

Até ao dia em que o Dandi chegou e se deparou com a fuga desta sua mulher, as coisas aparentemente correram bem, só que não tendo ele conseguido trazer de volta a Nhimba para casa por já não estar no Pelundo, começaram as complicações. Soubemos mais tarde que ela havia conseguido chegar até ao Cacheu, e dali até uma aldeia na fronteira do Senegal, sítio onde praticamente estaria a salvo de uma possível investida do seu marido.

O Comandante de Companhia ainda tentou resolver pessoalmente o assunto, mas não conseguiu convencer o Dandi a esquecer o comportamento da mulher, pelo que o acontecimento passou para o conhecimento do Comandante de Batalhão, e mais tarde para o Comandante do CAOP1, Coronel Paraq. Rafael Durão. Quando o vimos sair da sua DO a perguntar pelo Cabo que havia passado a guia de transporte para a Nhimba, para lhe partir o “focinho” (era hábito ele resolver tudo ao murro e à chapada), o Borges já não sabia onde se havia de meter, e nós pensámos logo, “estamos feitos”.
Comigo e com o “Bob” acabou por não haver qualquer problema, pois limitámo-nos a dar cumprimento ao que era normal nestas situações mas, com o Cabo “Bigodes”, tendo a situação ultrapassado o que estava estabelecido, as coisas começaram a complicar-se. Importa salientar que o Dandi era medalhado com a Cruz de Guerra, e tinha alguma influência / impacto junto das altas esferas militares, e foi assim que inclusive o assunto chegou também ao conhecimento do General Spínola.

Tendo este acontecimento ocorrido já bem perto do final da comissão e, portanto, já de saída de parte do Batalhão para o Cumuré, começaram desde logo a correr os mais variados boatos tais como, que o Borges ia ficar preso, que o Companhia ia ser castigada com mais tempo de comissão, que o Dandi havia de se vingar, enfim era já a ansiedade da partida para a metrópole a baralhar o raciocínio do pessoal.

A situação não ficou resolvida sem o nosso amigo Borges ser chamado ao Quartel-General já bem perto do dia do embarque, onde se deparou com uma mesa cheia de oficiais superiores para saberem o que efectivamente se havia passado. Contou ele mais tarde que o interrogatório foi de tal ordem, que a determinada altura quase faltou dizer que ele até nem gostava de mulheres, pois o problema descambou para a possibilidade do seu possível envolvimento com a Nhimba. Felizmente lá conseguiu argumentar da melhor forma (dar a volta ao texto), explicando que tudo não tinha passado de um grande equívoco e baralhação de nomes.

O General Spínola acabou por dar o caso como encerrado, mas o Cabo “Bigodes” só se sentiu realmente seguro e aliviado, quando o navio Uíge largou amarradas e, pelo Geba abaixo, se dirigiu ao alto mar.

Como se costuma dizer, não ganhou (ganhámos) para o susto… No fim, tudo acabou em bem, até porque o Dandi acabaria por aceitar sem mais problemas o desfecho. Importa salientar que a Nhimba Djassi era a sua mulher mais velha, talvez por isso se tornasse mais fácil arranjar uma outra mais nova… (minha suposição).


31 - Jolmete -  Maio 1972 Entrada do meu abrigo


32 - Jolmete - Maio 1972 Entrada do meu abrigo


48 - Jolmete -  Junho 1972 Trilhos de Pioce


 67 - Jolmete - Agosto 1972 Regresso da Bolanha de Gel


71 - Jolmete - Agosto 1972 Estrada Velha de Bula


74 - Jolmete - Agosto 1972 Regresso da segurança à água



Augusto Silva Santos
03-10-2012


Publicado por
Manuel Resende (Ferreira)




14 de setembro de 2015

Post Nº 33 - "Cabo Bigodes" O Homem Macaco (6)

Augusto Silva Santos
Fur. Mil. da CCAÇ 3306 em Jolmete (Pelundo – Teixeira Pinto)













6 - Cabo “Bigodes” O Homem Macaco

Esta passou-se numa daquelas noites em que, pela movimentação (ou não) da população, era esperada uma quase certa flagelação ao quartel. De tão cedo que era, quase não se via viva alma a circular pela tabanca, muito menos crianças, o que no mínimo era muito estranho. Assim, o indício era de uma quase certeza de que mais tarde ou mais cedo íamos mesmo “embrulhar”.

Recordo-me de que nessa noite de Abril de 1972 o Benfica jogava as meias-finais com o Ajax no antigo Estádio da Luz, para a então Taça dos Campeões Europeus, sendo o resultado final de zero a zero.

Calhou em sorte ser o meu grupo de combate a sair para fazer a segurança e denunciar possíveis movimentações do inimigo e, quando já estávamos todos convencidos de que nada se iria passar, lá rebentou o inevitável “fogachal”, precisamente do lado oposto a onde nos encontrávamos para, de certa forma, a fuga dos elementos do PAIGC se processar com menos hipóteses de confrontação.

Era a táctica deles do bate e foge. Só que contámos com a rápida resposta do pessoal que ficou no interior do quartel juntamente com o apoio da artilharia de Bula para bater a zona, pelo que o ataque se reduziu (felizmente para nós) a poucos minutos e sem consequências de maior.

Mas esta introdução tem como objectivo contar o que de rocambolesco e caricato se passou nos primeiros momentos do ataque ao quartel, que se processou precisamente do lado da chamada porta de armas, onde estava de serviço / sentinela no posto mais elevado e com alguns bons metros acima do solo, o meu amigo Cabo Borges, mais conhecido por todos pelo Cabo “Bigodes”, que levou de muito perto com uma valente roquetada, a qual de imediato pôs o posto em chamas. Sem hipótese de ripostar fogo com a Breda que encravou, só teve como solução atirar-se do posto abaixo.

Chegado cá abaixo, como o ataque continuasse e sem arma de defesa, logo se lembrou que a sua G3 havia ficado lá em cima no posto, ao qual voltou a subir tão rápido quanto possível e, já de novo na posse da sua “amiga”, qual símio, voltou novamente a atirar-se para o solo daquela considerável altura.

Quem a tudo isto conseguiu assistir, dizia que o Borges parecia o autêntico homem macaco. Reposta a calma, o nosso amigo “Bigodes” nem queria acreditar no que tinha conseguido fazer, ainda por cima sem ter sofrido qualquer ferimento.


46-Jolmete - Junho 1972 Regresso da segurança à água


47-Jolmete - Junho 1972 Chegada de mais uma operação


53-Pelundo - Julho 1972 C.CAÇ. 3307


54-Pelundo - Julho 1972 Com o meu irmão e amigos



02-08-2012
Augusto Silva Santos

Publicado por
Manuel Resende (Ferreira)