Augusto Silva Santos
Fur. Mil. da CCAÇ 3306 de Jolmete -
(Pelundo - Teixeira Pinto)
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- Nada de “Mariquices”
Foi
no já longínquo dia 3 de Março de 1972 (uma 6ª Feira), que recebemos indicação
para mais uma acção tida como normal, com progressão de dois Grupos de Combate
na região de Bagula, e respectiva emboscada em possível local de passagem de
elementos do PAIGC. Tratou-se de uma actividade diurna e, quando já nos
preparávamos para o possível regresso ao quartel, recebemos a informação que
deveríamos pernoitar naquele local, visto que no dia a seguir estava programado
juntar-se a nós mais um Grupo de Combate reforçado por elementos do Pelotão de
Caçadores Nativos e alguns voluntários, para uma acção conjunta em Badã / Ponta
Nhaga.
Esta
alteração de planos teve origem no facto de um caçador, elemento da população,
ter passado nesse dia a informação, haver perto da bolanha de Badã um
acampamento de passagem utilizado pelo PAIGC, onde estaria concentrado
armamento e víveres vindos de Ponta Matar, com destino provável à região do
Churo/Caboiana.
Fomos
assim surpreendidos com o facto de termos de pernoitar no mato sem que para
isso o pessoal estivesse devidamente preparado / equipado. Como é sabido por
quem pelas matas da Guiné andou, ao calor sufocante e húmido do dia, a seguir
vem o frio e o cacimbo da noite, por vezes com temperaturas bastante baixas, de
fazer tremer o queixo.
Foi
assim que, a partir de determinada altura, parte do pessoal já batia o dente,
encontrando-se bastante irrequieto, situação nada conveniente para aquilo que
deveria ser uma emboscada nocturna. Como o problema se começasse a agravar, eu
e os restantes graduados começámos a sugerir ao pessoal que se juntassem em
pequenos grupos de 3 ou 4 elementos, e se aconchegassem uns aos outros, para
com o calor corporal se irem mantendo mais ao menos aquecidos.
Recordo
ainda o espanto que foi para o pessoal tal sugestão, pois para a maioria deles
era impensável passar uma noite agarrado a outro homem, fosse por que motivo
fosse, com alguns a dizer mesmo que não alinhavam nesse tipo de “mariquices”.
Só que o frio começou a apertar cada vez mais, e não tardou que a solução fosse
mesmo de nos juntarmos para manter uma temperatura que nos permitisse passar
melhor a noite e a madrugada.
Infelizmente
para nós o dia seguinte foi um com as piores recordações para a nossa
Companhia, dado termos sofrido no decorrer da acção já referida um total de 10
feridos, alguns dos quais com bastante gravidade (o Capitão Comandante de
Companhia, 2 Alferes, 3 Furriéis, 2 Soldados, 1 Milícia e o próprio Comandante
da Milícia, o famoso Dandi).
Tirando
este aspecto negativo, que recordo com alguma dificuldade dado ainda me lembrar
da dor e sofrimento dos meus camaradas (dos 13 que estávamos mais ou menos
juntos eu fui um dos que escapou sem qualquer ferimento), recordo também que
durante algum tempo muitos dos soldados ainda evitavam falar na situação de
terem pernoitado agarrados ao seu semelhante, com receio de serem gozados ou
apelidados com adjectivos mais ou menos pejorativos, quando a conversa para aí
decorria. Eram outros tempos.
Anos
mais tarde, mais uma vez no decorrer de um dos almoços comemorativos da
Companhia, um desses ex-Soldados virou-se para o seu filho, também presente no
acto, mas desta vez com um sorriso bem rasgado e sem qualquer pudor, disse alto
e bom som: - “Olha filho, já dormi uma noite no mato agarrado a este Furriel”.
Claro que a risada foi geral.
13-Jolmete - Março 1972 Acapamento PAIGC em Badã
14-Jolmete - Março 1972 Acapamento PAIGC em Badã
39-Jolmete - Junho 1972 Traseiras do meu abrigo
40-Jolmete - Junho 1972 Tempo de matar a sede...
42-Jolmete -
Junho 1972 Entrada do meu abrigo
02-08-2012
Augusto Silva Santos
Publicado por
Manuel Resende (Ferreira)