José Alexandre Marreiros Alves
Fur. Mil. em Jolmete (Pelundo – Teixeira Pinto)
CCAÇ 2585 – BCAÇ 2884
FANADO NA GUINÉ-BISSAU
Estive em Jolmete e assisti a esta festa ... a do "fanado", ou seja, à apresentação pública dos então meninos e meninas e que agora vêm como rapazes e raparigas crescidos. Em suma retiraram-lhes a virgindade aos moços e os lábios e clitóris às miúdas. Era tradição na altura, espero que hoje isso já não exista.
A propósito das fotos que anexei nesta publicação sobre o "fanado", aqui vos deixo, principalmente para os mais ignorantes na matéria, um documentário e fotos Paula da Costa – consultora MGF (Mutilação Genital Feminina) na Guiné-Bissau.
Diz ela:
... Na Guiné-Bissau todos os grupos étnicos realizam o Fanado (ritual de iniciação). Para os rapazes ou homens, depende de cada grupo, o Fanado culmina com a circuncisão. Alguns grupos étnicos têm o Fanado das meninas ou jovens mulheres. Nos grupos islamizados o Fanado das meninas culmina com o “corte” (mutilação genital feminina). Em vários grupos o tipo de corte também é diferenciado: remoção total ou parcial do clítoris.
.... O Fanado realiza-se, normalmente, na floresta – em sítios isolados – onde nenhum elemento da comunidade pode entrar durante o período do ritual – 4 a 5 semanas. Nos centros urbanos o Fanado é realizado nos bairros na periferia das cidades e longe das habitações. O Fanado é efectuado em terreno sagrado e com a participação e aceitação de várias divindades locais.
.... O Fanado tem os seus próprios protectores espirituais que terão como função não permitir a entrada de pessoas estranhas ao ritual nem de forças malignas. As Fanatecas (excisadoras femininas) e os Fanadores (homens que fazem a circuncisão) são os instrumentos desta ligação entre o mundo real e o mundo espiritual. Durante esse período os jovens ou crianças adquirem conhecimentos sobre a vida, normas de comportamento dentro da família e da comunidade.
Reforça-se o grupo de pertença e as questões étnicas e culturais. Muitas vezes os participantes nos Fanados (crianças, jovens ou adultos) são alvo de violência física e psicológica, como forma de preparação para a vida adulta. A casa que é construída para o Fanado, “Barraca”, e as esteiras utilizadas no Fanado são queimadas no fim do ritual. A família é o suporte económico do Fanado: alimentação, roupas, pagamento às pessoas responsáveis no Fanado. Toda a comunidade está envolvida neste ritual de iniciação.
O pagamento é feito através de dinheiro ou de bens: arroz, sabão, panos, etc. Este pagamento é uma parte importante e fundamental para o rendimento económico das famílias das Fanatecas (excisadoras). A participação no Fanado dá às crianças e aos jovens ou aos adultos um estatuto mais elevado dentro do seu grupo étnico. Também lhes possibilita ter acesso a outros níveis de escalões etários – que lhes são vedados ao não participarem nestes rituais.
... A entrada na casa do Fanado é feita através do chamamento de tocadores de tambor que circulam pelas aldeias ou pelos bairros.
... Dentro do Fanado há uma cumplicidade entre os participantes e também um pacto de silêncio do que se passa lá dentro. Muito raramente uma pessoa fala do que aconteceu a si próprio ou aos outros. É um assunto tabu. Mesmo quando há informações de morte dentro do Fanado – as pessoas não relacionam essa morte com o acto da mutilação genital feminina ou circuncisão. Normalmente as justificações para essa morte são de carácter místico externo ao Fanado – intervenção de forças estranhas ao Fanado. Esta forma desresponsabiliza qualquer pessoa que tenha tido intervenção directa ou indirecta na morte. Quando termina o Fanado as crianças, jovens ou adultos são entregues à comunidade numa grande festa colectiva da passagem ritualista. Os participantes recebem presentes dos familiares e da comunidade. Em Abril de 2010 reiniciou-se um projecto na Guiné-Bissau de luta contra a MGF (Mutilação Genital Feminina), incluindo, agora, 5 ONGs Guineenses e com o apoio da ONG alemã, WFD – Weltfriensdienst. Este projecto chama-se “Djinopi” que significa “Vamos para a frente”.
Paula da Costa – consultora MGF – Guiné-Bissau
Marreiros Alves (ex-Furriel)
Publicado por:
Manuel Resende (Ferreira)
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