9 de setembro de 2015

Post Nº 32 - A Emboscada das Abelhas (5)

Augusto Silva Santos
Fur. Mil. da CCAÇ 3306 de Jolmete – (Pelundo - Teixeira Pinto)














5 - A Emboscada das Abelhas

Lendo há algum tempo atrás um episódio do nosso camarada Luís Faria sobre o que consigo se passou com um “ataque” de abelhas, que poderia ter consequências trágicas (felizmente tudo não passou de um valente susto), veio-me à lembrança uma situação semelhante (salvo as devidas proporções) que comigo se passou.

Estando dois dos nossos grupos de combate em progressão para realizar mais uma emboscada em possível local de passagem do inimigo, baseados no relato de um elemento da população, em dada altura da deslocação e, já muito perto do objectivo, fomos surpreendidos por uma autêntica debandada pelo pessoal que seguia na frente, com cada um a correr para seu sítio, sem que nos fosse dada qualquer explicação sobre o que estava a acontecer, e numa autêntica desorganização.

Sendo o meu grupo o que seguia na retaguarda, com o mato bastante denso e sendo difícil de descortinar o que realmente se estava a passar, perante tal cenário, mesmo sem até então termos ouvido qualquer tipo de contacto (tiros), logo nos colocámos todos em posição de combate prontos para uma eventual protecção aos nossos camaradas em apuros.

Não tardou porém muito tempo, para que igualmente o meu grupo se levantasse das suas posições e, desordenadamente, cada um se pusesse a fugir para o seu lado, pois do que efectivamente se tratava era de um violento ataque de abelhas, que ainda conseguiu fazer várias vítimas, algumas das quais com bastantes ferradelas.

A minha sorte e do guia das milícias que comigo de perto seguia, de seu nome Vermelho, foi termos connosco um pano de tenda com o qual nos cobrimos completamente, conseguindo assim escapar ao ataque e a algumas picadelas.
Foi um valente susto, felizmente também aqui sem consequências de maior, mas ainda demorou algum tempo até que conseguíssemos recompor todo o pessoal, mas o que desde logo ficou decidido é que naquele local já não iríamos emboscar.
É que ainda tínhamos presente o que havia acontecido a um camarada Furriel da Companhia do Pelundo que, algum tempo antes numa situação semelhante, levou tantas ou tão poucas ferradelas, nomeadamente na cabeça, que ficando inconsciente teve de ser evacuado de helicóptero.


15 - Jolmete - Março 1972 Acapamento PAIGC em Badã


17 - Jolmete - Abril 1972 Convívio na messe


30 -Jolmete - Maio 1972 Com o Fidalgo, filho do Cajan


36 - Jolmete - Junho 1972 Na hora da correspondência


45 - Jolmete - Junho 1972 Entrada do Quartel



15-07-2012
Augusto Silva Santos

Publicado por
Manuel Resende (Ferreira)


3 de setembro de 2015

Post Nº 31 - De Caçador a Caçado (4)

Augusto Silva Santos
Fur. Mil. da CCAÇ 3306 – Jolmete (Pelundo – Teixeira Pinto)
  













4 - DE CAÇADOR A CAÇADO

Estando a época das chuvas em plena actividade e, consequentemente os reabastecimentos por via terrestre à Companhia demoradas por tempo indeterminado dadas as dificuldades de acesso a Jolmete, nalgumas ocasiões começava a escassear a comida dita normal, pelo que o recurso à mais variada alimentação de ocasião era absolutamente comum, embora repetitiva e nem sempre do nosso agrado.

Assim, passados alguns dias nesta rotina alimentar, o pessoal começava a ficar farto das rações de combate e de outro tipo de alimentação à base de conversas, sempre com o arroz presente, pelo que era igualmente normal o recurso aos mais variados estratagemas para se arranjar algo fora daquele esquema.

Uns recorriam ir à tabanca na tentativa de arranjar um leitão ou um frango (nem sempre da forma mais correcta), ou mesmo comprar alguns peixes apanhados pela população nos braços do rio Cacheu. Outros tentavam caçar algo, se bem que da caça grossa estivéssemos dependentes de quem sabia onde efectivamente a podia fazer, nomeadamente de noite, como era o caso do Comandante da Milícia, de seu nome Dandi. Ainda me lembro de ter comido hipopótamo, gazela, e búfalo.

Da outra bicharada menor encarregávamo-nos nós de tentar caçar, quase sempre à volta do quartel. Lembro-me de numa ocasião me terem dado a comer macaco que alguém caçou numa armadilha, julgando eu que era cabra do mato. Na altura foi um manjar. Este era o meu caso que, beneficiando do empréstimo de uma espingarda de pressão de ar de 5,5mm (*), lá me ia aventurando a caçar alguma pardalada para o petisco (o lema era tudo o que voasse era bom para comer), e assim lá me iam orientando com as mais diversas aves e, quando a sorte estava do meu lado, com algumas rolas e pombos verdes à mistura, para a partilha com os amigos mais próximos.

Acontece que numa dessas minhas deambulações pelas cercanias do quartel, e sempre avisando as sentinelas de que andaria por ali perto, mais propriamente pela orla da mata, sou surpreendido pela correria mais ao menos desenfreada de uma bajuda acompanhada pela sua mãe, a qual passando por perto me gritou bem alto: - Fuji Furriel, fuji…

Escusado será dizer que, qual “Carlos Lopes”, deitei a correr quanto pude e só parei ofegante já dentro do quartel. Na altura não vi ninguém, mas no outro dia ao passarmos com uma patrulha pelo local e num sítio um pouco mais afastado, lá estavam as marcas de algumas sandálias de plástico, daquelas tão bem conhecidas de todos nós e que eram usadas pelo PAIGC.
Por pouco não virei de caçador a caçado…
                               
Obs. (*) Importa salientar que, passados 40 anos, vim a saber que a espingarda pressão de ar utilizada, foi aquela que o Manuel Resende também utilizou nas suas caçadas, e que lá deixou para o pessoal da CCAÇ. 3306.
E que arranjo nos deu!

Jolmete Agosto 1972 Trilhos de Gel - Caláque


Jolmete Agosto 1972 Convívio


Jolmete Agosto 1972 Estrada de Gel


Jolmete Agosto 1972 Estrada Velha de Bula - Ponta Catel




15-07-2012
Augusto Silva Santos



Nota de Manuel Resende:
Esta pressão de ar, Diana 35 de 5,5 de calibre, foi comprada na casa Pintosinho de Bissau, a meu pedido, pelo nosso 1º Sarg. Vinagre numa das suas deslocações mensais a Bissau em 1970. Já não me recordo o preço, mas, antes de regressarmos, vendi-a a alguém que a comprou por um preço simbólico. Devo dizer que a 100 metros não falhava uma perdiz ou uma rola das negras (que eram maiores). Também muitos pombos verdes caíram, até descobrir que tinham muitos bichos nos intestinos. A estreia e afinação de pontaria foi com um abutre, de que tenho uma foto no meu álbum.




Publicado por
Manuel Resende (Ferreira)


28 de agosto de 2015

Post Nº 30 - A Cobra Cuspideira (3)

Augusto Silva Santos
Fur. Mil. da CCAÇ 3306 de Jolmete (Pelundo – Teixeira Pinto)















3. A Cobra Cuspideira

Embora a maioria do pessoal da minha Companhia fosse constituída por Soldados do norte do país, nomeadamente de Trás-os-Montes, portanto por pessoas habituadas a trabalhar no campo e a lidar com os mais variados animais, ou seja, sem qualquer medo de bichos, sempre havia um outro que, pelos mais diversos motivos, não podia ouvir falar em cobras.

Foi uma dessas situações que levou a que se inventasse que já se havia visto perto do quartel cobras cuspideiras, bicho terrível que poderia cegar uma pessoa, ao cuspir o seu veneno para os olhos.

Era uma realidade, no entanto ainda hoje desconheço se existem ou não cobras cuspideiras na Guiné (*), não tendo isto na altura passado de uma mera invenção para assustar um dos Soldados, que tinha um terrível pavor que tal lhe viesse a acontecer. Mal ouvia o rastejar de um rato ou de um lagarto em cima da chapa que cobria o abrigo, aí estava ele em alerta total. Lembro-me que a esses lagartos chamávamos de “paga dez”, por estarem sempre a fazer o que pareciam flexões.

Para em definitivo (ou não) se tentar acabar com aquela fobia, alguém um dia se colocou no lado de fora numa das vigias do abrigo imitando o rastejar e o silvo de uma cobra, para atrair o coitado do Soldado, que estava na sua hora de descanso. Para completar a situação, outro entrou no abrigo a gritar que lá fora estava uma enorme cobra.

Tendo aquele espreitado pela vigia para ver se via algo, é-lhe despejado um valente bocheco de água nos olhos. Escusado será dizer que o infeliz deitou a correr para o meio da parada, com alguns trambolhões pelo meio, pois tentava tapar os olhos com as mãos, gritando: - Estou cego, estou cego, estou cego!...

Obs.: (*)  Mais tarde viria a confirmar que efectivamente existem, e que são mesmo muito perigosas. Trata-se da cobra “Naja nigricollis Reinhardt” que normalmente chega ao comprimento de 2 metros.


 11 - Jolmete -  Março 1972 Junto ao morteiro


16 - Jolmete - Março 1972 Fogo na Tabanca


21 - Jolmete - Abril 1972 Treinar para a carta


28 - Jolmete -  Maio 1972 Junto ao posto rádio




30-06-2012
Augusto Silva Santos



Nota de Manuel Resende:
Amigo Augusto, em relação às cuspideiras, ó se as havia ..., e tenho a certeza que se aproximavam mais dos três metros. Tivemos um caso muito grave de uma que se alojou nos cibos de protecção ao abrigo do 2º grupo, e que fazia esperas cirúrgicas ao pessoal, quando entrava no abrigo depois do jantar. Punha a cabeça na vigia e o primeiro que passasse próximo era atingido. Isto prolongou-se por bastante tempo e nunca a apanhámos. Eu cheguei a fazer esperas ao bicho com a minha pessão de ar, a Diana 35 de 5,5 (calibre), mas nunca a vi. Encontrámos mais tarde a pele (da mudança) e que tinha cerca de 2,5 metros, daí o que disse atrás.
Tivemos vários soldados atingidos, mas não me recordo se houve algo de mais grave.
Também quando andava às perdizes nos arredores do quartel, uma vez vi uma, negra e grande que se meteu num buraco de “Baga-Baga”. Como ela fugiu, continuei o meu trabalho da caça, mas assustei-me.


Comentário do nosso amigo Cuba:
Chama-se Sobral. Era de Alcácer do Sal e fui eu que falei com o médico pelo Rádio, porque os enfermeiros não sabiam qual o tratamento a fazer. O médico ia dizendo e eu escrevendo. Nunca me esqueço. Foi no abrigo do segundo pelotão, e o Sobral foi evacuado para a Metrópole. Quando chegámos a Lisboa, lá estava ele à nossa espera. Nunca ficou cego.



Publicado por
Manuel Resende (Ferreira)