28 de agosto de 2015

Post Nº 30 - A Cobra Cuspideira (3)

Augusto Silva Santos
Fur. Mil. da CCAÇ 3306 de Jolmete (Pelundo – Teixeira Pinto)















3. A Cobra Cuspideira

Embora a maioria do pessoal da minha Companhia fosse constituída por Soldados do norte do país, nomeadamente de Trás-os-Montes, portanto por pessoas habituadas a trabalhar no campo e a lidar com os mais variados animais, ou seja, sem qualquer medo de bichos, sempre havia um outro que, pelos mais diversos motivos, não podia ouvir falar em cobras.

Foi uma dessas situações que levou a que se inventasse que já se havia visto perto do quartel cobras cuspideiras, bicho terrível que poderia cegar uma pessoa, ao cuspir o seu veneno para os olhos.

Era uma realidade, no entanto ainda hoje desconheço se existem ou não cobras cuspideiras na Guiné (*), não tendo isto na altura passado de uma mera invenção para assustar um dos Soldados, que tinha um terrível pavor que tal lhe viesse a acontecer. Mal ouvia o rastejar de um rato ou de um lagarto em cima da chapa que cobria o abrigo, aí estava ele em alerta total. Lembro-me que a esses lagartos chamávamos de “paga dez”, por estarem sempre a fazer o que pareciam flexões.

Para em definitivo (ou não) se tentar acabar com aquela fobia, alguém um dia se colocou no lado de fora numa das vigias do abrigo imitando o rastejar e o silvo de uma cobra, para atrair o coitado do Soldado, que estava na sua hora de descanso. Para completar a situação, outro entrou no abrigo a gritar que lá fora estava uma enorme cobra.

Tendo aquele espreitado pela vigia para ver se via algo, é-lhe despejado um valente bocheco de água nos olhos. Escusado será dizer que o infeliz deitou a correr para o meio da parada, com alguns trambolhões pelo meio, pois tentava tapar os olhos com as mãos, gritando: - Estou cego, estou cego, estou cego!...

Obs.: (*)  Mais tarde viria a confirmar que efectivamente existem, e que são mesmo muito perigosas. Trata-se da cobra “Naja nigricollis Reinhardt” que normalmente chega ao comprimento de 2 metros.


 11 - Jolmete -  Março 1972 Junto ao morteiro


16 - Jolmete - Março 1972 Fogo na Tabanca


21 - Jolmete - Abril 1972 Treinar para a carta


28 - Jolmete -  Maio 1972 Junto ao posto rádio




30-06-2012
Augusto Silva Santos



Nota de Manuel Resende:
Amigo Augusto, em relação às cuspideiras, ó se as havia ..., e tenho a certeza que se aproximavam mais dos três metros. Tivemos um caso muito grave de uma que se alojou nos cibos de protecção ao abrigo do 2º grupo, e que fazia esperas cirúrgicas ao pessoal, quando entrava no abrigo depois do jantar. Punha a cabeça na vigia e o primeiro que passasse próximo era atingido. Isto prolongou-se por bastante tempo e nunca a apanhámos. Eu cheguei a fazer esperas ao bicho com a minha pessão de ar, a Diana 35 de 5,5 (calibre), mas nunca a vi. Encontrámos mais tarde a pele (da mudança) e que tinha cerca de 2,5 metros, daí o que disse atrás.
Tivemos vários soldados atingidos, mas não me recordo se houve algo de mais grave.
Também quando andava às perdizes nos arredores do quartel, uma vez vi uma, negra e grande que se meteu num buraco de “Baga-Baga”. Como ela fugiu, continuei o meu trabalho da caça, mas assustei-me.


Comentário do nosso amigo Cuba:
Chama-se Sobral. Era de Alcácer do Sal e fui eu que falei com o médico pelo Rádio, porque os enfermeiros não sabiam qual o tratamento a fazer. O médico ia dizendo e eu escrevendo. Nunca me esqueço. Foi no abrigo do segundo pelotão, e o Sobral foi evacuado para a Metrópole. Quando chegámos a Lisboa, lá estava ele à nossa espera. Nunca ficou cego.



Publicado por
Manuel Resende (Ferreira)


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